
Com cuidado, o engenheiro de informação Bruno Sanches coloca sobre a mesa do Laboratório de Sistemas Integrados da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) um aparelho de cor laranja e formato cônico, com 15 centímetros (cm) de diâmetro, parecido com o bojo de um sutiã. Não é sem razão. Trata-se do protótipo de uma nova geração de aparelhos projetados para fazer exames das mamas que se ajustam ao redor dos seios e fazem imagens em diferentes ângulos em busca de tumores que precisem ser eliminados. O Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima que ocorram 73,6 mil novos casos de câncer de mama por ano no país entre 2023 e 2025. Trata-se do tumor mais comum entre mulheres em todas as regiões do Brasil, com taxas mais altas no Sul e Sudeste.
Uma das principais características do novo sistema de imageamento, um projeto conjunto da Poli-USP e do Departamento de Engenharia Elétrica do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), é funcionar por micro-ondas, uma nova rota tecnológica investigada também em universidades dos Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Suécia, Itália, Japão e Austrália. Os aparelhos de mamografia hoje em uso para detectar tumores de mama operam por raios X, um tipo de radiação ionizante que pode trazer riscos à saúde.
Apesar de ser bem tolerado pela maioria das mulheres, o exame realizado por mamógrafos tradicionais pode causar desconforto e dor, causada pela compressão das placas do equipamento sobre os seios. O novo dispositivo projetado pelos pesquisadores paulistas se molda às mamas e evita o processo doloroso. Em 2023, 4,4 milhões de mamografias foram realizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Léo Ramos Chaves / Revista Pesquisa FAPESPProtótipo do sistema de imageamento por micro-ondas projetado na USP e no IFSPLéo Ramos Chaves / Revista Pesquisa FAPESP
“Queremos oferecer uma alternativa complementar à mamografia”, comenta Sanches. Segundo o engenheiro, o aparelho poderia ser útil especialmente para mulheres com seios densos, para as quais a mamografia tem menor sensibilidade. A densidade dos seios, característica que independe de seu tamanho, é a proporção de tecido fibroso e glandular em relação ao tecido adiposo ou gordura.
O padrão do Colégio Americano de Radiologia (ACR) para exames de imagem classifica as mamas em quatro densidades: predominantemente gordurosa e menos densa, mais fáceis de examinar pela mamografia; com áreas de tecido fibroglandular esparsas; heterogeneamente densa, o que pode dificultar a detecção de pequenos nódulos ou tumores; e extremamente densa, tornando a identificação de lesões na mamografia ainda mais difícil. O sistema proposto pode ser vantajoso nos casos de mamas densas, pois as propriedades eletromagnéticas dos tecidos envolvidos são discrepantes, sendo possível diferenciá-los.
“Quanto mais densa a mama, mais branca ela aparece na mamografia, dificultando a identificação dos tumores, que também são brancos”, explica o médico radiologista Almir Bitencourt, do A.C.Camargo Cancer Center, um dos principais centros nacionais de pesquisa, diagnóstico e tratamento nessa área. “Nessas situações, exames complementares, como ultrassonografia ou ressonância magnética, costumam ser recomendados.”
Ondas de rádio
O protótipo da USP e do IFSP usa um dispositivo eletrônico que transmite e recebe sinais, o chamado transceptor de micro-ondas, com antenas embutidas. O transceptor emite ondas de rádio de banda ultralarga, com frequência central de 6,4 giga-hertz (GHz), que atravessam o tecido mamário e retornam ao aparelho ao encontrar estruturas internas mais densas, como possíveis tumores. Os sinais refletidos são processados por uma unidade de processamento de imagem, que emprega um algoritmo para gerar um mapeamento detalhado da região (ver infográfico).
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